sexta-feira, 27 de abril de 2012

As girafas têm o pescoço comprido para chegar às folhas altas ou chegam às folhas altas porque têm o pescoço comprido?


Imagem: girafa no Parque Nacional do Kruger, África do Sul



À luz do actual conhecimento sobre biologia evolutiva, a resposta é clara. Mas remontemos ao séc. XIX, altura em que a criação divina e a imutabilidade das espécies começaram a ser postas em causa para se admitir que estas poderiam ter sofrido transformações ao longo dos tempos. Dois nomes aparecem intimamente ligados ao conceito de evolução das espécies, Jean Baptiste de Monet, cavaleiro de Lamarck, e Charles Darwin (*).

Lamark e Darwin diferiam muito nas suas explicações sobre o processo evolutivo das espécies. Por exemplo, Lamark defendia que as espécies poderiam modificar as suas características ao longo da sua vida e depois transmitir essa alteração à sua descendência. Darwin, por outro lado, reconheceu a importância da variação das características que os indivíduos de uma dada população apresentam e argumentou que essa variação deveria estar relacionada com o meio ambiente onde essa população se encontrava. Deste modo, um indivíduo que tivesse características que de alguma forma o beneficiavam seria capaz de se reproduzir mais, passando essas características à sua descendência. Um processo a que Darwin chamou selecção natural.

Hoje sabemos que essas características são o resultado de erros de cópia do DNA -a molécula que contém a informação para a “construção e funcionamento” de cada ser vivo- a que se dá o nome de mutação. E as mutações acontecem de forma espontânea, a cada divisão celular; algumas são imediatamente detectadas e ‘corrigidas’ mas outras escapam a este mecanismo de controlo e passam a fazer parte da informação genética de um indivíduo. Se uma determinada característica, num determinado meio ambiente, confere algum tipo de vantagem para a sobrevivência e reprodução desse indivíduo, ela será alvo do processo de selecção natural. Ou seja, esse indivíduo tem maior probabilidade de transmitir essa característica à sua descendência, levando ao aumento do número de indivíduos com essa característica na população.

Voltando à pergunta inicial, podemos supor que uma girafa terá nascido com uma mutação que originou o alongamento do seu pescoço, o que lhe permitiu alimentar-se das folhas mais altas das árvores. Esta vantagem na alimentação ter-se-á traduzido numa melhor condição física para sobreviver e para se reproduzir. Logo, a mutação para o pescoço comprido terá sido transmitida à sua descendência, que por sua vez, tendo o mesmo tipo de vantagem, a terá também transmitido à sua descendência. E assim, ao logo das gerações, o número de girafas com o pescoço comprido aumentou de tal modo que hoje apenas vemos girafas com esta característica.

(*) Na verdade há um terceiro nome: o de Alfred Russel Wallace, um naturalista britânico que chegou à mesma conclusão que Darwin sobre o papel da selecção natural na evolução das espécies. As conclusões a que ambos chegaram foram comunicadas à Sociedade Lineana de Londres em simultâneo.



[Este texto foi adaptado para responder à pergunta 'Porque é que as girafas têm o pescoço grande?', colocada ao projecto de divulgação de ciência Ciência 2.0. A nova versão pode ser lida aqui.]

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